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sexta-feira, 6 de junho de 2014

Efeito da adição de diferentes substâncias no batimento de claras em neve


Uma das principais propriedades da clara é a capacidade de formação de espuma, que consiste na agregação de ar em uma rede composta por proteínas que se ligam quando submetidas a um estresse físico – no caso, o batimento das claras. Durante o batimento ocorre desnaturação da albumina, com desdobramento em sua estrutura.

Esse batimento produz inicialmente grandes bolhas de ar, que têm seu tamanho reduzido à medida que se continua o batimento. Assim, a redução do tamanho e aumento do número das bolhas de ar resulta em um maior volume devido a incorporação de ar.

O volume resultante é maior quando o ovo é fresco e está na temperatura ambiente.

Além disso, a adição de diferentes substâncias à clara produzem diversos efeitos, conforme demonstra os experimentos realizados no Laboratório de Técnica Dietética da FSP/USP.

Foram realizados oito experimentos, cada um com uma clara, onde adicionou-se diferentes substâncias antes e durante o seu batimento.

Durante a formação da espuma as claras passam por 4 estágios distintos, sendo o primeiro caracterizado por um líquido transparente com bolhas de ar (espumante). O 2º estágio apresenta picos arredondados, bolhas menores, mais esbranquiçadas, aparência brilhante e úmida (espuma macia). No 3º estágio aparecem picos firmes, bolhas bem menores, muito brancas e que não escorrem da tigela (espuma dura). O 4º estágio caracteriza-se por falta de brilho, espuma muito branca, rígida, quase quebradiça (espuma seca).

As claras foram batidas em batedeira comum, de uso doméstico, até atingirem a característica de espuma dura (3º estágio).

A Tabela 1 mostra a substância adicionada, as quantidades o tempo de batimento da clara em neve para cada teste realizado.


Tabela 1. Adições realizadas, suas respectivas quantidades e o tempo de batimento.




* O sal e o açúcar foram adicionados aos 45s, quando a espuma começou a se formar. Nos demais experimentos as substâncias foram adicionadas antes do batimento.

As claras foram então tranferidas para tigelas de vidro, onde permaneceram durante 30 minutos.

Avaliou-se o tempo de batimento das claras, as características da espuma, a estabilidade e o resíduo de água após os 30 minutos.

Tempo de batimento x substância adicionada

O tempo de batimento determinou a  ordem de classificação das adições:
Sal durante < sem adição, óleo, açúcar, água e ácido < sal < ácido tartárico < água

A Figura 1 mostra os diferentes aspectos e volumes obtidos nos experimentos.

 
Figura 1. Aparência das claras batidas em neve, de acordo com o que lhe foi adicionado.


Nota-se diferença no aspecto de cada clara, de acordo com o que lhe foi adicionado.


A Figura 2 mostra a clara batida sem adição e com adição de açúcar.


 

Figura 2. Aparência da clara sem adição e com adição de açúcar aos 45s de batimento.

Pode-se observar que a presença do açúcar confere maior brilho, maior estabilidade da espuma e bolhas menores devido à interferência das moléculas de açúcar na ligação das proteínas com a água – as moléculas de açúcar se ligam às de água tornando o líquido viscoso e estabilizando o sistema.

A Figura 3 mostra a clara batida sem adição e com adição de ácido.

 
  
Figura 3. Aparência da clara sem adição e com adição de ácido.


A adição de ácido aumenta a estabilidade da clara e necessita maior tempo de batimento. Entretanto, confere à clara uma característica quebradiça, frágil, por agilizar a coagulação das proteínas ao redor das bolhas.

  
A Figura 4 mostra a clara batida sem adição e com adição de óleo.

 

Figura 4. Aparência da clara sem adição e com adição de óleo.


O óleo impede a formação da espuma, porque as ligações químicas entre entre moléculas de proteína e de gorduras têm diferente natureza das estabelecidas entre as proteínas para a formação da rede proteica que sustenta a espuma.

A Figura 5 mostra a clara batida sem adição, com adição de água e com adição de água e ácido.


 
  
Figura 5. Aparência da clara sem adição, com adição de água e com adição de água e ácido.


A água aumenta o volume mas necessita de maior tempo de batimento, além da espuma apresentar estabilidade muito baixa. Isso ocorre devido à diluição das proteínas da clara (ocasionada pela adição da água) e o consequente afastamento das moléculas, que dificulta a formação e a estabilidade da espuma.
A presença de água e ácido aumenta ainda mais o volume, mas a estabilidade continua baixa.

A Figura 6 mostra a clara batida sem adição, a que teve adição de sal no início do batimento e a que teve adição de sal durante o batimento (aos 45s).

Figura 6. Aparência da clara sem adição, com adição de sal no início do batimento e com adição de sal durante o batimento.

O sal adicionado no início do batimento aumenta a formação de espuma, mas diminui sua estabilidade porque seus cristais se dissolvem e competem por sítios de ligação entre as moléculas de proteínas, dificultando as ligações necessárias para a formação da espuma. O sal adicionado durante o batimento aumenta a estabilidade da espuma, uma vez que ajuda no aprisionamento de água na estrutura.

A Tabela 2 mostra os efeitos de cada adição sobre as claras, a estabilidade e o líquido desprendido após o batimento.



  
O líquido desprendido após o batimento avalia a estabilidade da clara, que dependerá também de outros fatores como tempo deixado em descanso após o batimento e manuseio das claras, além das diferentes substâncias adicionadas no início ou durante o batimento.

As claras batidas somente com água podem ser vantajosas se utilizadas em preparações onde não haverá mistura com muitos ingredientes, para não ocorrer perda do volume. Acrescentando ingrediente ácido é possível aumentar um pouco a estabilidade da espuma.

Já para as preparações nas quais as claras serão misturadas a outros ingredientes há a necessidade da estabilidade ser maior e a adição do sal e do ácido tartárico é bem vinda.

 Bibliografia:

Araújo, W. M. C.; Montebello, N. P.; Botelho, R. B. A.; Borgo, L. A. Alquimia dos alimentos – 2ª edição. Editora SENAC – 2011. Brasília – DF.

Domene, S. M. A. Técnica Dietética – Teoria e aplicações. Guanabara Koogan – 2011. Rio de Janeiro – RJ.


quinta-feira, 5 de junho de 2014

Cocção de ovos


No Laboratório de Técnica Dietética da FSP/USP, foi realizado o experimento de cocção de ovos, a fim de verificar o ponto de cocção da gema e avaliar a formação do anel verde formado ao redor da gema.
O tempo de cozimento determina o grau de coagulação da clara e da gema, o que também depende da temperatura, que por sua vez está relacionado com a altitude local. O experimento foi realizado na cidade de São Paulo.

Os ovos utilizados foram inicialmente deixados à temperatura ambiente (se forem colocados gelados na água em ebulição pode ocorrer diferença de pressão, ocasionando a ruptura da casca).

Foram então cozidos com diferentes tempos de cocção, com e sem resfriamento imediato.

O experimento foi realizado colocando-se 4 xícaras (chá) de água no fervedor e levando-se ao fogo para ebulição. Após o início da fervura, manteve-se o fogo baixo a fim de evitar choques no ovo.

Colocou-se o ovo na água e marcou-se o tempo. O ovo foi então retirado da água e resfriado sob água corrente (nos casos em que houve o resfriamento).

Foram testados diferentes tempos de cocção: 4, 8, 10, 12, 15 e 20 minutos.

Para verificar o ponto de cozimento da gema foi realizada a cocção nos tempos 4, 8, 10, 12, 15 e 20 minutos. Nos tempos 10 e 12 minutos o teste também foi realizado sem resfriamento, a fim de verificar se há diferença.

Para verificar a formação do anel verde ao redor da gema foi realizada a cocção nos tempos 12, 15, 20 e 30 minutos. Nos tempos de 12 e 15 minutos o teste também foi realizado com resfriamento, também para verificar se há diferença.


 Efeitos do tempo de cocção e presença ou ausência de resfriamento na cocção de ovos

A Figura 1 abaixo ilustra o efeito gema dos diferentes tempos de cocção sobre a gema. Em todos os casos houve o resfriamento imediato após o tempo de cozimento.


 Figura 1: Efeito dos diferentes tempos de cocção sobre a gema.


A Tabela 1 demonstra os resultados obtidos:

Tabela 1. Efeitos sobre o cozimento da gema, nos diferentes tempos de cocção.
  




Comparação entre a presença ou ausência de resfriamento

As Figuras 2 e 3 demonstram o efeito do resfriamento no ponto de cozimento da gema:

Figura 2: Efeito da presença ou ausência de resfriamento no tempo de cocção de 10 minutos.


Aos 10 minutos com resfriamento o cozimento da gema ainda não está completo. Já sem o resfriamento, como a cocção não foi interrompida, o cozimento se completa.


Figura 3. Efeito da presença ou ausência de resfriamento no tempo de cocção de 12 minutos.

Aos 12 minutos com resfriamento a clara está firme porém macia e a gema já completamente cozida e cremosa. Aos 12 minutos sem resfriamento há o início da formação do anel verde entre a clara e a gema, conforme mostra a Figura 3. Com o resfriamento imediato do ovo isso não ocorre.

Efeito do tempo de cocção sobre a formação do anel verde

As Figuras 4, 5, 6 e 7 mostram a presença e a intensidade de formação do anel verde no ovo.

 

Figura 4. Aos 12 minutos inicia-se a formação do anel verde, sendo que com o resfriamento a reação de formação do mesmo cessou. Sem o resfriamento, a intensidade de formação do anel foi maior, uma vez que o cozimento continuou.

Figura 5. Com 15 minutos a presença do anel também é maior no experimento em que não houve resfriamento e a cor é ainda mais intensa do que aos 12 minutos de cozimento.



 

Figura 6. Aos 20 minutos de cozimento a intensidade da cor do anel é ainda mais escura.



Figura 7. Com 30 minutos de cocção a intensidade do anel é ainda maior.

O experimento mostrou que o ovo que apresentou melhores características sensoriais (cor, aroma e textura) com segurança microbiológica foi o cozido por 12 minutos seguido de resfriamento. Pode-se verificar que quanto maior o tempo de cocção, maior é a formação do anel verde. Sem o resfriamento a intensidade de formação também é maior, pois o ovo ainda continua a cocção mesmo após ser retirado do fogo. A partir de 20 minutos de cozimento pode haver também a liberação de odores fortes.

Na Técnica Dietética os ovos cozidos podem ser utilizados para a decoração de pratos, sendo colocados nas preparações tanto inteiros quanto picados de diferentes formas.
Também deve-se observar a preparação na qual serão utilizado – se a cocção será interrompida (como em saladas, por exemplo) ou não (como em sopas). Logo, nesses casos onde o cozimento deve cessar, é muito importante observar o tempo de cocção correto dos ovos, tanto para evitar a formação do anel verde entre a clara e a gema quanto para garantir a destruição das bactérias patogênicas.


Bibliografia:
Araújo, W. M. C.; Montebello, N. P.; Botelho, R. B. A.; Borgo, L. A. Alquimia dos alimentos – 2ª edição. Editora SENAC – 2011. Brasília – DF.


Philippi, S. T. Nutrição e Técnica Dietética – 2ª edição. Manole – 2006. Barueri, SP.